Jorge Arbache
Vicepresidente de Sector Privado, CAF -banco de desarrollo de América Latina y el Caribe-
Estima-se que, em condições normais, a maioria das PMEs da América Latina conta com recursos próprios para fazer frente aos custos fixos por até 30 dias. Portanto, parece razoável supor que boa parte dessas PMEs poderia entrar em colapso técnico durante a crise da Covid-19, colocando em risco milhões de negócios e paralisando as cadeias de pagamentos, o que amplificaria os efeitos adversos da pandemia.
Neste contexto, muitos governos da região implementaram programas públicos de apoio emergencial às empresas. Os programas desbloquearam crédito com a oferta de linhas e garantias parciais, programas de rolagem de dívidas, obrigações financeiras e impostos e programas temporários de apoio à folha de pagamento.
Isso gerou novas oportunidades para empresas com problemas de liquidez, fato fundamental para a manutenção do emprego e do tecido produtivo. Porém, as mudanças nas condições de mercado associadas à crise, como câmbios tecnológicos e nos padrões de consumo e renda, bem como as dúvidas sobre a duração e o formato da recuperação econômica, a possibilidade de uma segunda onda de infecções e incertezas sobre a disponibilidade da vacina, complicaram ainda mais a situação para muitas empresas. De fato, em meio a uma crise sem precedentes como esta, pode ser difícil diferenciar falta de liquidez de insolvência, mesmo em empresas que presumivelmente fortes antes da crise.
Parece razoável que algumas das empresas beneficiadas por programas públicos possam enfrentar problemas de solvência posteriormente, provavelmente após os períodos de carência do financiamento emergencial e rolagem das dívidas impostos, ou que poderia se tornar uma armadilha para recuperação econômica. Afinal, os programas de emergência podem adiar, mas não evitar, eventuais falências de empresas.
O problema é que a sobrevivência dessas empresas não é neutra e pode comprometer a competitividade das demais, com as quais fazem negócios; ser uma barreira à entrada de novas empresas e ao crescimento das que já entraram no mercado; dificultar o aumento da produtividade média da economia; afetar as finanças e os fundos de garantia públicos; e deteriorar a qualidade da carteira de crédito dos bancos, comprometendo balanços e exigindo aumento das provisões, o que poderia afetar a disponibilidade de recursos e o apetite de risco para novas operações de crédito no futuro.
Um estudo global do PIB sugere que 50% das empresas enfrentarão problemas com o serviço da dívida no próximo ano. Não seria exagero conjecturar que essa proporção poderia ser ainda maior entre as PMEs da região.
Tudo isso aponta para a utilidade de se ter uma espécie de “chave de crédito”, que alocasse recursos às empresas de forma racional e eficiente para promover uma recuperação saudável. Porém, infelizmente, o mundo é muito mais complicado. Afinal, em um contexto tão hostil como o atual, pode haver muitos falsos positivos e falsos negativos na identificação de fragilidades e condições de sobrevivência das empresas.
A questão torna-se especialmente preocupante quando se leva em conta a realidade da maioria das PMEs da região, para as quais as dificuldades de acesso ao crédito e aos mercados e os problemas de recursos, gestão e deficiências tecnológicas são a norma enão algo típico de períodos de crise.
O que fazer nesse contexto? É claro que não há um conjunto único de recomendações, pois as medidas dependem das condições específicas de cada país, incluindo o estágio da crise de saúde, espaço fiscal, sistema financeiro e instituições. No entanto, há pontos de interesse comuns.
Será especialmente útil avançar para métodos mais sofisticados para compreender e identificar os problemas das PMEs, a fim de lhes dar um tratamento de crédito adequado. Nesse sentido, poderia-se recorrer a bancos de dados inovadores, como os utilizados por fintechs, por exemplo, como ferramentas adicionais de avaliação de crédito.
As intervenções públicas podem visar à sustentabilidade da recuperação empresarial. Nesse sentido, o apoio a programas emergenciais poderia estar condicionado à participação ativa das empresas em programas de formação de recursos humanos, melhoria da gestão e incorporação e uso de novas tecnologias, especialmente aquelas associadas à transformação digital, com o objetivo de reduzir custos e ampliar a produtividade e a competitividade.
Outras recomendações incluiriam trocas de dívidas, títulos de carteiras de PMEs e reformas da lei de falências, que são amplamente ineficientes e precipitam a falência de empresas solventes e viáveis, mas que enfrentam problemas de liquidez.
Por fim, uma possível orientação limitante no acesso ao crédito, que poderia levar ao colapso das PMEs, deve ser acompanhada de programas de renda mínima e emprego emergenciais, a fim de mitigar o aumento do desemprego e da pobreza e gerar renda para sustentar a retomada da economia.
A boa notícia é que a crise da saúde já está sob controle em vários países, as economias da região já começaram a dar sinais de recuperação e as políticas emergenciais estão dando tempo aos bancos para reforçar suas reservas de liquidez para cobrir as necessidades potenciais. Muitas incertezas, mas há um fato: a gestão de crédito adequada e oportuna será o fator determinante para que a economia se recupere e se mantenha nos eixos.