Jorge Arbache
Vicepresidente de Sector Privado, CAF -banco de desarrollo de América Latina y el Caribe-
Um aspecto que ajuda a compreender o funcionamento dos mercados é a tomada de decisão em contextos de incerteza. Embora investidores e empreendedores prefiram operar em ambientes mais amigáveis e previsíveis, também se interessam em operar em ambientes mais complexos e imprevisíveis, mas até certo ponto. Afinal, a previsibilidade está associada à capacidade de identificar e mitigar riscos, à formação de preços e à estimação de custos e taxas de retorno.
Assim que quando o ambiente de negócios é bastante imprevisível e/ou está demasiadamente exposto a novas fontes de incertezas, então os investidores e empreendedores normalmente ajustam, postergam ou até cancelam projetos. Nesses contextos, projetos com maiores retornos sociais muitas vezes dão lugar a negócios especulativos ou são desviados para outras geografias.
Dito isto, vivemos tempos de grandes e intensas mudanças, muitas delas muito rápidas, que estão tornando o ambiente de negócios menos previsível e menos propício para investimentos de maior retorno social, como as infraestruturas. São muitas as novas fontes de imprevisibilidade e, dentre elas, estão a pandemia, as mudanças climáticas, as mudanças tecnológicas, as ameaças geopolíticas e a extraordinária e crescente concentração de mercados em nível global. Essas e outras mudanças já têm tido, mas provavelmente terão impactos ainda mais contundentes na tomada de decisão e no funcionamento dos mercados.
Embora seja um fenômeno geral, países emergentes, como os da nossa região, estão mais expostos àquelas mudanças. Isto porque as fontes de imprevisibilidade e suas consequências tendem a ser magnificadas pelas muitas falhas de mercado e pelas circunstâncias econômicas, sociais e políticas específicas a cada um dos nossos países. Para não ir longe, pense nos impactos notadamente fortes da pandemia na mortalidade das empresas, no crescimento econômico, nas finanças públicas, na pobreza e na educação de crianças e jovens. E pense também nas recorrentes descontinuidades de políticas públicas resultantes de mudanças de governos e do voluntarismo político. Temas como esses acendem a luz de alerta do investidor.
De fato, embora ofereça uma miríade de oportunidades de novos negócios e investimentos, as incertezas que pairam sobre a região são tais que nem mesmo a elevada liquidez dos mercados internacionais teve os efeitos esperados no influxo de investimentos estrangeiros diretos (IED). Mas a região precisa voltar a crescer para compensar os efeitos mais imediatos da pandemia e também os mais prolongados resultantes da desaceleração econômica iniciada após o fim do super ciclo de commodities na primeira metade da década passada. E, para isto, precisará contar com os investidores nacionais e internacionais, o que requer oferecer um ambiente de negócios mais previsível.
Os bancos multilaterais de desenvolvimento (BMD) estão contribuindo para aqueles esforços colocando anualmente cerca de US$ 45 bilhões na América Latina em apoio a projetos e operações com os setores público e privado. São montantes expressivos, mas relativamente modestos diante das necessidades. Para referência, representam apenas algo como 20% a 25% de todo o IED anual recebido pela região.
Os braços dos BMD voltados para o apoio ao setor privado têm enfatizado operações que atuam na identificação e redução de custos e riscos, bem como têm buscado alocar recursos de forma mais estratégica, de forma a reduzir incertezas, atrair recursos de terceiros e ampliar a presença privada nos mercados – pense, a modo de exemplo, na significativa expansão das agendas de PPP e concessões em vários países da região, o que tem feito toda a diferença para o desenvolvimento, e que contaram com o apoio decisivo daquelas instituições. Desta forma, mais do que mirar no “quanto”, os bancos têm mirado no “onde” e no “como” intervir, de forma a potencializar os impactos diretos e indiretos das suas intervenções.
Grosso modo, aquele apoio segue em duas vertentes. De um lado estão ações que ajudam a organizar o funcionamento dos mercados e a tornar bancáveis projetos de investimento que, do contrário, teriam maior dificuldade de acesso a mercado. Ali estão incluídos o apoio aos esforços públicos de desenvolvimento e modernização de marcos institucionais e regulatórios dos mercados e de formação de capacidades nas agências reguladoras, o apoio a estudos de pré-factibilidade e estruturação de projetos, o assessoramento financeiro em favor de PPPs e concessões, as cooperações técnicas para o desenvolvimento e estruturação de operações e o apoio com conhecimento em favor do desenvolvimento de novos mercados e novos modelos de negócios.
De outro lado estão ações que visam dar acesso a recursos em condições condizentes com as realidades dos projetos. Ali estão incluídos financiamentos e cofinanciamentos com prazos e condições compatíveis com as necessidades e características das operações de alto retorno social, apoio ao desenvolvimento do mercado de garantias, empréstimos subordinados e operações A/B, apoio à emissão de títulos temáticos, operações de equity, ampliação da carteira de operações com moedas locais, desenvolvimento de veículos e fundos de investimentos de propósito específico para gerir ativos de terceiros, como fundos de pensão e family offices, dentre outros instrumentos.
Por fim, os BMD estão se estruturando para apoiar os países naquela que será a maior fonte de imprevisibilidade e incertezas, que são as mudanças climáticas. Os países da região terão que enfrentar os desafios da adaptação e da mitigação, mas, também, explorar e viabilizar a gigantesca agenda de novos negócios e o mercado de créditos de carbono. Para isto, será especialmente necessário colocar à disposição novos instrumentos financeiros e não financeiros e muito conhecimento.