O ir e vir da geografia dos investimentos

Article date: February 09, 2023

Autor del post - Jorge Arbache

Vicepresidente de Sector Privado, CAF -banco de desarrollo de América Latina y el Caribe-

As últimas décadas testemunharam um intenso fluxo e refluxo da localização geográfica dos investimentos globais. Seguindo a ordem liberal que foi estabelecida no período pós-guerra, por volta da década de 1980, houve um movimento crescente de transferência de plantas industriais de produção e exportação para a Ásia em virtude do baixo custo da mão de obra disponível lá. Nascia a fragmentação da produção, ou a globalização como a conhecemos.

Nessa viagem, a China acumularia massa industrial crítica e experiência empresarial e se tornaria o principal destino do investimento estrangeiro direto – e a grande “fábrica do mundo”. Essa ordem viria a se expandir, dando origem a uma crescente interdependência econômica, comercial e de investimentos, cujos benefícios seriam compartilhados por muitos na forma de bens de consumo de baixo preço. O rápido crescimento da renda, no entanto, combinado às mudanças demográficas, mais tarde, levaria a China a promover a realocação de suas próprias plantas industriais para países da região asiática com mão de obra ainda mais barata, ao mesmo tempo em que redirecionaria a atenção de seu parque industrial para estágios mais sofisticados das cadeias de valor.

Porém, essa migração da indústria para a Ásia não seria indolor. A estagnação econômica nas antigas regiões industriais dos Estados Unidos e da Europa levaria a crescentes polêmicas sobre os benefícios da globalização, que reverberariam em campanhas políticas e até mesmo no Brexit. A crise de fornecimento de medicamentos importados e outros suprimentos na China e o colapso da logística durante a pandemia forneceriam ainda mais munição para os críticos da globalização. Foi nesse ambiente, e regado pela crescente disputa geopolítica entre os Estados Unidos e a China, que conceitos como nearshoring e reshoring seriam cunhados, os quais pregam as supostas virtudes de trazer de volta para casa as plantas industriais americanas que operam na Ásia. No entanto, é improvável que esses conceitos tenham os efeitos sociais pretendidos. E a principal razão é que a comoditização das tecnologias incentiva a automação de novas plantas.

O próximo passo nessa reversão do investimento viria das políticas de controle de capital e exportação dos EUA e da Europa, bem como de generosos programas de subsídios e protecionismo à indústria, o que alteraria a ordem do comércio e a geografia do investimento. Infelizmente, a globalização como a conhecemos está chegando ao fim, e com ela muitos de seus benefícios, como o consumo das classes média e baixa. Os princípios liberais que nortearam a destinação dos investimentos perdem espaço e a geopolítica e as intervenções de mercado entram em cena. Mas o capital é fungível e sempre detecta negócios. Para mitigar os potenciais efeitos nocivos do protecionismo “Made in China”, as empresas chinesas estão transferindo fábricas para o México para acessar os mercados dos EUA e do Canadá a partir daí, beneficiando-se da logística e do acordo comercial USMCA.

As andanças da geografia dos investimentos também não parariam por aí, pois há diferentes forças sobre a mesa que influenciam sua direção, algumas delas até com sinais trocados, em um tabuleiro complexo e repleto de interesses e intervenções. Um exemplo é a guerra na Ucrânia, que, combinada com a pandemia e as agendas geopolíticas, levaria o mercado de energia a uma instabilidade e incertezas de oferta sem precedentes. Os preços, especialmente na Europa, atingiriam níveis recordes, algo insustentável para muitos setores e empresas. Certamente, variações consideráveis nos custos de energia elétrica têm implicações na competitividade e, até mesmo, na sobrevivência das empresas, sobretudo das mais expostas ao comércio internacional, o que já está causando realocações.

A crescente implementação de regulamentos ambientais também está influenciando a geografia do investimento. As empresas sob pressão para descarbonizar já estão transferindo usinas para regiões abundantes em energia verde, seguras e com preços marginais em queda e, se possível, menos expostas a intensos problemas geopolíticos. Trata-se do powershoring. Eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes também estão influenciando as estratégias de localização.

A resiliência, portanto, está se tornando um elemento central da geografia dos investimentos, enquanto eficiência e custos começam a perder um pouco de relevância. No entanto, os elementos de custo, como a energia verde, continuarão a exercer uma influência importante na tomada de decisões, especialmente em setores com utilização intensiva de energia. Afinal, não há como ignorar, por exemplo, que os custos de produção de hidrogênio a partir de eletricidade renovável podem ser de USD 3-4/kg na China e nos Estados Unidos e de USD 5-7/kg no Japão e na Europa, enquanto no Brasil e em outros países da região, chegam a ficar USD 1/kg ou menos. Tudo indica que a desconcentração e a diversificação da localização geográfica das fábricas se tornarão questões críticas para as estratégias corporativas de segurança produtiva e de mercado, especialmente para empresas com presença global.

Números preliminares indicam que o Brasil e o México, países que enfrentam diversos desafios, atraíram US$ 91 bilhões e US$ 37 bilhões, respectivamente, em investimento estrangeiro direto em 2022, níveis elevados para os padrões históricos. Para 2023, as perspectivas são ainda melhores. Essa é uma evidência a favor da diversificação geográfica da produção, apontando para novas vias de oportunidade para os países em desenvolvimento.

A geografia do investimento provavelmente permanecerá volátil, mas as empresas também devem procurar maneiras de continuar a mitigar o risco com base em estratégias adaptáveis. Para a América Latina e o Caribe, que têm tantas soluções para oferecer aos investidores, é hora de trabalhar em uma agenda de fatores facilitadores que tornem a região uma opção ainda mais atraente para o investimento estrangeiro direto.

Jorge Arbache

Close modal
Jorge Arbache

Vicepresidente de Sector Privado, CAF -banco de desarrollo de América Latina y el Caribe-

Antes de su ingreso a CAF fue Secretario de Asuntos Internacionales del Ministerio de Planificación, Desarrollo y Gestión de Brasil y Secretario Ejecutivo del Fondo de Inversión Brasil-China. También fue economista jefe en el Ministerio de Planificación en Brasil; Asesor económico principal de la Presidencia de BNDES y Economista Principal del Banco Mundial en Washington, DC. También es profesor de economía en la Universidad de Brasilia. Arbache tiene más de 28 años de experiencia en las áreas de gobierno, academia, organizaciones internacionales y sector privado. Su interés radica en agendas de crecimiento económico y políticas sectoriales que incluyen comercio internacional, inversión, productividad, competitividad, innovación, economía digital, industria y servicios. Es autor de cuatro libros y docenas de artículos científicos publicados en revistas académicas internacionales. Es licenciado en Economía y en Derecho y Doctor en Economía por la Universidad de Kent (Reino Unido).

Categories
Productivity

Highlighted news

More highlighted news

Subscribe to our newsletter