Gerenciar PME na era digital
Este artigo baseia-se na publicação da revista Debates IESA, e foi escrito por Rebeca Vidal e Marcel Antonorsi Blanco, professor convidado do IESA.
As PME representam cerca de 15% da matriz empresarial da América Latina, oferecem mais de 30% dos empregos, e seu peso nas exportações é inferior a 5%. Relatórios do CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- e da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) alertam que a produtividade tende a diminuir à medida que a escala da empresa se reduz. Um fator que explica essa relação é a dificuldade em incorporar avanços tecnológicos ao modelo operacional. Por isso, o desafio para os gestores de PME consiste em desenvolver modelos mais eficientes e produtivos.
Revolução digital, economia 4.0 e empresa 4.0 são apenas três expressões que, juntas, esboçam uma ideia aproximada do novo campo onde muitos empresários latino-americanos terão que travar suas principais batalhas. Mas será que a transformação digital é uma oportunidade para desenvolver esses modelos? Como as PME podem navegar na onda tecnológica?
É essencial que os diretores de empresas se conscientizem da transformação digital, ou da "Quarta Revolução Industrial", como muitos analistas a batizaram. Seus antecessores foram a Primeira Revolução Industrial (impulsionada pelo surgimento da máquina a vapor), a Segunda Revolução Industrial (baseada no uso da eletricidade em atividades industriais) e a Terceira Revolução Industrial (marcada pelo uso massivo da computação e de tecnologias da informação).
A Quarta Revolução Industrial — nascida das inovações digitais — fornece à sociedade e às empresas uma maior conectividade. Serve de base para a economia 4.0 e para a empresa 4.0.
Cada revolução industrial permitiu que o mundo dos negócios operasse de forma mais eficiente e criasse produtos e serviços de maior valor agregado para os mercados; duas circunstâncias que acarretaram aumentos de produtividade e competitividade. Essas vantagens só foram alcançadas pelas empresas com maior capacidade de adaptação e maior dimensão; ou seja, as que foram capazes de arcar com os investimentos necessários para garantir a adoção oportuna da tecnologia.
Uma característica particular da revolução atual é que o aproveitamento das oportunidades depende, em grande parte, da capacidade profissional do recurso humano e do seu grau de alfabetização e formação digitais. Por exemplo, é necessário contar com pessoal capaz de se familiarizar com soluções que permitem armazenar e processar informações na nuvem para deixar os arquivos e as interações físicas no passado. Também é importante dominar a captação e o acúmulo imediato de dados, derivados das interações nas etapas de um processo ou um serviço de atendimento ao cliente, pois proporciona uma maior inteligência do negócio.
Na revolução digital, graças ao progresso da conectividade, as empresas adquirem uma natureza onipresente, que possibilita o avanço constante dos processos. A comunicação de máquina a máquina (M2M) permite uma maior colaboração entre as etapas de um processo e uma interação de melhor qualidade com clientes e fornecedores, dois fatores que incentivam o desenvolvimento das cadeias de valor e a possibilidade de executar simulações a um custo menor.
Competências para navegar na onda digital
Além de uma compreensão básica das questões tecnológicas, o desafio das PME requer o ajuste dos modelos mentais de seus proprietários e gestores; ou seja, dos paradigmas simbólico-normativos que enquadram as formas de ver, pensar e agir de líderes e referências organizacionais. Nas grandes empresas há equipes especializadas nessas tarefas; mas nas PME é preciso tirar tempo da gestão rotineira do negócio, para investi-lo no planejamento e na execução de estratégias relacionadas à revolução digital. A capacidade de adaptação, a gestão da mudança e o monitoramento contínuo de tendências são tarefas essenciais em face da evolução permanente das tecnologias tradicionais.
Para sair na frente de seus concorrentes, um gestor de PME deve primeiro entender completamente os avanços tecnológicos associados à indústria e ao mercado. Também precisa esmerar-se para decifrar tendências e identificar as oportunidades de negócio e investimento.
A tarefa de pensar no futuro é o foco de várias iniciativas colaborativas de prospecção. Uma das mais conhecidas é a chamada Future Agenda, a mais ampla do mundo, pois se alimenta de informações e estatísticas provenientes de mais de 5.000 organizações em 45 cidades. A iniciativa é impulsionada por cinquenta entidades líderes em setores tão diversos como finanças, tecnologia, consultoria, saúde ou energia. Além disso, no grupo de promotores participam instituições acadêmicas, think tanks e organismos públicos.
Como resultado de tal esforço, os organizadores definiram 61 tendências gerais em constante atualização para a próxima década. Entre as principais tendências identificadas destacam-se: envelhecimento populacional (levando ao crescimento do segmento de idosos e ao aumento da idade de aposentadoria), transformação das organizações em facilitadoras de espaços e ferramentas para a produtividade das pessoas (mais do que fontes de emprego), diminuição da influência do governo nos negócios (dada a maior velocidade de resposta das transnacionais e os blocos econômicos) e melhorias no rendimento humano (derivadas de avanços tecnológicos que impactam o funcionamento do organismo, tais como implantes e tecido biológico impresso em 3D).
Da análise à ação
O exercício de monitoramento de oportunidades atuais e futuras nos permite visualizar o papel das empresas – independentemente de sua escala – no âmbito das novas dinâmicas globais. Nunca antes houve tantas facilidades para acessar as informações e usá-las em benefício do crescimento das empresas. A verdadeira vantagem estratégica é identificar, no fluxo caótico de dados e estatísticas, as informações mais confiáveis para ordená-las de uma forma inteligente, a fim de traduzi-las em novas oportunidades de negócio e investimento. Tal habilidade permitirá, por exemplo, especificar a probabilidade real de entrar com sucesso em novos mercados ou de vincular-se a cadeias crescentes de valor global. Também ajudará a oferecer uma diferenciação criativa, expressa em produtos e serviços adaptados às tendências do mercado.
A implementação é sempre a fase mais complexa. Por essa razão, os gestores das PME devem reconhecer a necessidade de um conceito sistêmico da organização, que nunca será apenas estrutura, mas também estratégias, processos, sistemas, culturas e modelos administrativos. Todos esses componentes já são afetados pelas novas tecnologias digitais e, portanto, devem ser repensados e alinhados para obter vantagens competitivas e conquistar e manter clientes cada vez mais exigentes. A rigidez das normas, práticas, costumes e procedimentos deve ser substituída por uma concepção gerencial orientada à flexibilidade e à resiliência.
Os novos tempos serão para os «mestres digitais», que combinem capacidade tecnológica com capacidade de liderança (Westerman, Bonnet e McAfee, 2014). Os conservadores - os que apenas começam - e os seguidores de modas (fashionists) serão superados. Passar da análise à ação requer um estilo de liderança acostumado a gerenciar e moldar a mudança. Uma mudança que se torna muito mais sedutora quando abordada a partir da perspectiva da "organização 4.0".