Dia Internacional da Educação: uma celebração repleta de desafios
Este post é de autoria de Luis Carrera, Bibiam Díaz, Cecilia Llambí e Dinorah Singer.
A pandemia de Covid-19 impôs uma emergência aos sistemas educacionais, a qual, depois de quase dois anos, se transformou em uma crise prolongada. O fechamento total ou parcial das escolas afeta quase duas em cada três crianças e adolescentes na América Latina e Caribe. Mais de 86 milhões de estudantes da região permanecem fora das salas de aula, apesar dos grandes esforços dos governos para retomar o ensino presencial. No último trimestre de 2021, era esperada a volta de 47 milhões de alunos às escolas, mas a nova onda de casos causada pela variante ômicron levou à extensão das suspensões preventivas na maioria dos países da região. O efeito mais preocupante do fechamento das escolas é a evasão definitiva. A UNESCO estima que mais de três milhões de estudantes latino-americanos e caribenhos não retornarão ao sistema de educação formal.
Os principais desafios que a pandemia impôs aos sistemas educacionais estão relacionados com o aprofundamento do déficit e do fosso socioeconômico da aprendizagem, consequência do acesso desigual a recursos de apoio à educação (tanto nas escolas como nos lares) e o aumento do impacto que a pandemia teve nas famílias de baixa renda. Na América Latina e Caribe, apenas 77% dos estudantes de 15 anos têm acesso à internet em casa e esse desafio foi ainda maior para os grupos mais desfavorecidos. Tal cobertura, que inclui alunos com conectividade domiciliar por meio de dispositivos eletrônicos (computadores, tablets) ou telefones celulares, é 19 pontos percentuais inferior à média da OCDE. Além disso, a cobertura é significativamente menor entre os estudantes de baixa renda: apenas 45% dos alunos do quintil inferior têm acesso à internet em casa e 60% não possuem computador.
A América Latina e o Caribe podem ser uma das regiões mais afetadas em termos de proporção de alunos abaixo do nível mínimo de desempenho em competências. A ferramenta de simulação aplicada pelo Banco Mundial para o ano de 2020 permite estimar que esse percentual de alunos poderá aumentar de 55% para 71% após 10 meses de fechamento das escolas.
As estratégias políticas devem, então, centrar-se na garantia de condições para a prevenção da evasão escolar, a reinserção de crianças e jovens no sistema educacional e o nivelamento da aprendizagem, com especial enfoque na população mais vulnerável (ver Políticas para reduzir as lacunas educação no pós-pandemia). Aqui citamos alguns em que a CAF oferece apoio, por meio de financiamento e/ou assistência técnica aos países da região:
- Um diagnóstico oportuno da situação de aprendizagem no retorno das aulas presenciais é crucial para entender o efeito da pandemia nos alunos, de acordo com o nível educacional e características como contexto socioeconômico, localização geográfica, gênero ou condição de deficiência. Para isso, uma opção é projetar e disponibilizar testes para que os centros educacionais possam ter um diagnóstico da aprendizagem de seus alunos, o que lhes permite gerar planos de requalificação sob medida (exemplos disso são o “Diagnóstico Integral de Aprendizagem”, do Chile e o teste on-line “Aristas em Classe”, do Uruguai). Outra opção é a aplicação de testes padronizados em larga escala, que permitem identificar áreas de atuação (incluindo competências socioemocionais) e grupos populacionais que requerem maior atenção, ainda mais se forem aplicados por meio de um censo. Nesta área, o CAF, por meio do Programa para Melhorar o Acesso e a Qualidade Educacional de Jujuy, Argentina (PROMACE) atualmente apoia o Ministério da Educação da referida província na implementação do Primeiro Censo de Avaliação de Aprendizagem da Província, dirigido aos alunos do 3º ano do ensino médio.
- Incorporação integral de tecnologias na educação. O cenário causado pela pandemia evidenciou a necessidade de promover e aprofundar a incorporação de tecnologias nos sistemas educacionais, levando em consideração não apenas a disponibilidade de infraestrutura e dispositivos tecnológicos, mas também a adoção de uma abordagem abrangente do uso da tecnologia para transformar a forma de ensinar e aprender e para uma melhor gestão de políticas e programas educacionais. Para isso, é necessário enfrentar os múltiplos déficits e características hereditárias dos sistemas educacionais da região, desde a disponibilidade de infraestrutura e dispositivos tecnológicos, até a revisão do modelo pedagógico, dos conteúdos e da formação e acompanhamento dos professores. Neste âmbito, o CAF desenvolveu um estudo regional que propõe uma agenda abrangente para a adoção de tecnologia na educação, ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento de uma ferramenta de diagnóstico que permite identificar o nível de progresso de um país nas dimensões que compõem essa abordagem abrangente (governança, modelos pedagógicos, conectividade, proteção de dados, formação e apoio de professores e sistemas de informação) e traçar roteiros para o desenvolvimento de programas e políticas nesta área. Tal ferramenta está sendo aplicada na província de Santa Fé, no âmbito do “Programa Santa Fé Mais Conectada”, financiado pelo CAF na Argentina.
O CAF também financia e presta assistência técnica em diversas iniciativas relacionadas a: a) infraestrutura de conectividade para residências e escolas (Programa Santa Fe +Conectada, Argentina); b) redesenhos curriculares e disponibilização de dispositivos tecnológicos para escolas, alunos e professores (Programa de Integração e Desenvolvimento Social e Ambiental do Município de Camaçari, Brasil; PROMACE-Jujuy Argentina; Projeto de Melhoria da Educação On-line em Trinidad y Tobago); c) desenvolvimento de plataformas e conteúdos digitais para o ensino (Santa Fe +Conectada, Argentina; Plataforma Virtual de Aprendizagem para Alunos e Professores, Costa Rica; Produção de objetos virtuais e formação de professores para escolas técnicas secundárias, Panamá) ; d) desenvolvimento de conteúdos curriculares, plataformas, materiais e formação de professores para o ensino de informática, inclusive a distância (iniciativa PROGRAM.AR, Programa de Capacidade Empreendedora, Argentina); e) formação de professores em atuação para fortalecer habilidades digitais e o uso da tecnologia no ensino (Santa Fe +Conectada, PROMACE- Jujuy, Argentina; MOOC Transformação digital de professores) ; y f) expansão de modelos escolares alternativos utilizando tecnologia para o acesso à educação de jovens em zonas rurais dispersas (escolas rurais mediadas por TIC, PROMACE Jujuy/UNICEF). - Sistemas de alerta precoce para prevenir a evasão escolar. Com o fechamento das escolas, a pandemia fez com que os alunos ficassem impossibilitados de assistir suas aulas presencialmente, prejudicando não apenas a aprendizagem, mas também a interação e a conexão com seus colegas e professores e afetando a continuidade educacional. Enfrentar e prevenir a evasão escolar torna necessário identificar os estudantes em risco de evasão, por meio de sistemas de alerta precoce que utilizam informação administrativa em nível individual, familiar, escolar ou comunitário para identificar pessoas pertinentes. Uma vez identificadas, é necessário atendê-las em tempo hábil, com estratégias para evitar sua evasão do sistema. Recentemente, o CAF apoiou essa estratégia na Argentina e no Uruguai, promovendo: a) o fortalecimento dos sistemas de gestão de trajetória escolar nominal (Sistema de Proteção de Trajetórias do Uruguai; Projeto de Melhoria da Infraestrutura Escolar, “Volta à Sala de Aula” - Sistema Integrado de Informação Digital Educacional (SInIDE) Argentina); b) o desenvolvimento de modelos de previsão/identificação de alunos em risco de evasão escolar que possam ser integrados a sistemas de informação (iniciativa “Mãos em Dados” no Uruguai e nas províncias de Buenos Aires e Mendoza, na Argentina em>) e c) por meio da criação de consensos políticos e roteiros para o estabelecimento de sistemas integrais de informação, tirando proveito do intercâmbio de informações e boas práticas na implementação entre as províncias da Argentina (iniciativa “Consensos pela Educação” coordenada pela Fundação Observatório Argentino para a Educação)
- Aprimoramento da infraestrutura escolar: A pandemia colocou sobre a mesa a importância das escolas cumprirem as condições mínimas de construção para que as atividades educacionais presenciais decorram em um ambiente seguro e saudável. Essas condições incluem a possibilidade de alunos, professores e demais funcionários da escola interagirem em ambientes ventilados, com espaço suficiente e disponibilidade de serviços básicos para promover as práticas de higiene necessárias. Nesse âmbito, o CAF financia múltiplas iniciativas para a construção, ampliação e melhoria da infraestrutura educacional, entre as quais se destacam-se: o Projeto de Melhoria da Infraestrutura Escolar “Volta às Salas de Aula”, realizado pelo Ministério da Educação da Argentina, com foco em garantir condições seguras para o retorno às aulas e com abrangência em todo o país; o programa provincial Santa Fe +Conectada, com foco nas escolas básicas e médias; PROMACE Jujuy, que atinge todos os níveis de ensino e incorpora a expansão das escolas rurais mediada pela tecnologia; o Programa de Ampliação e Melhoria da Infraestrutura Escolar da Província de Buenos Aires, com foco no ensino fundamental e médio; PROINFRA Brasil (município de Fortaleza), com foco em escolas de tempo integral e centros de educação infantil; e projetos de infraestrutura educacional por meio da Participação Público-Privada (PPP) no Uruguai, com foco principalmente na educação básica e fundamental. Reconhecendo a importância da infraestrutura escolar para um retorno seguro às salas de aula, o CAF preparou algumas Diretrizes para formulação e desenho de infraestrutura educacional, buscando apoiar atores do setor público, executores e gestores de programas na formulação de ações de infraestrutura educacional, desde sua concepção até a produção do projeto executivo.