Os novos atores da segurança cidadã
Há anos, na maioria dos países da região, a insegurança está entre as principais preocupações da sociedade. Os díspares e crescentes processos de urbanização criaram as condições para que novas formas de economias informais e ilegais se desenvolvessem junto a uma série de delitos territoriais de alto impacto social: crimes patentes, predatórios e aspiracionais, e a constituição de mercados e economias ilegais em expansão.
Nossa região abriga 42 das 50 cidades mais violentas do mundo, 14 dos 25 países com as maiores taxas de feminicídio e onde, apesar de reunir apenas 8% da população mundial, ocorrem 33% dos homicídios do planeta. Nas últimas décadas do século XX houve um aumento dos crimes “comuns”, especialmente em espaços públicos, bem como do sentimento de insegurança, ou seja, a preocupação, o medo, a angústia causada pela possibilidade de ser vítima de um crime e que modifica o comportamento cotidiano das pessoas.
A criminalidade e a violência têm um impacto fortemente negativo no desenvolvimento. A insegurança é uma forma de exclusão social, política e econômica, devido aos seus altos custos tangíveis e intangíveis, diretos e indiretos. Estima-se que os países da região, em média, invistam 3,5% do PIB nos serviços de segurança e justiça, quase o dobro dos países centrais. Além disso, a criminalidade, a violência e o medo restringem a mobilidade das pessoas e as atividades que decidem realizar, e aprofundam as condições de desigualdade ao afetar as áreas e grupos sociais mais vulneráveis, principalmente os jovens e as mulheres.
Embora, tradicionalmente, os governos centrais fossem responsáveis por responder à insegurança, os governos locais foram assumindo funções e responsabilidades cada vez maiores diante das demandas dos cidadãos por melhores condições de segurança. Os municípios têm a vantagem da proximidade e do conhecimento dos problemas cotidianos dos cidadãos, bem como das manifestações locais de insegurança, o que lhes permite intervir de forma mais direta e rápida, melhor alocando os recursos disponíveis para problemas específicos.
Na medida em que os governos locais entendam que a insegurança e o medo da criminalidade são fenômenos complexos, multicausais, com diferentes abrangências e naturezas, e que afetam particularmente os grupos mais vulneráveis, especialmente mulheres, meninas e diversidades, estarão em condições de liderar sua abordagem para tomar decisões que respondam às preocupações e demandas dos cidadãos e de integrar a segurança em sua política de desenvolvimento urbano.
Para isso, enfrentam uma série de desafios. Prefeitos precisam assumir a liderança e o controle político do sistema de segurança local, por meio de estratégias de prevenção e controle do crime e da violência, gerando espaços públicos mais seguros e livres do medo, com iluminação correta, melhorias nos parques e praças, por meio da instalação de sistemas de videovigilância e alarmes comunitários, ações de controle e vigilância de bairro ou implantação de guardas municipais. É necessário também que atuem nos processos sociais e culturais que geram as condições para que as pessoas se envolvam em atividades criminosas, implementando intervenções preventivas de médio e longo prazo; e que sejam gerados mecanismos para fortalecer a comunidade como ator chave na coprodução de segurança, convocando-a a participar da concepção, implementação e avaliação das iniciativas de segurança. O planejamento das intervenções deve ser baseado em um diagnóstico rigoroso e uma análise que leve em conta seu impacto no território.
A agenda municipal de conhecimento sobre questões de segurança deve ser reforçada, por meio da produção de informações úteis a partir de novas metodologias e técnicas de investigação e análise criminal, e o desenho adequado dos sistemas de gestão da informação para gerar diagnósticos precisos e de qualidade, que permitam intervir com políticas eficazes. Em Córdoba, Argentina, o CAF apoiou a implementação de um quadro de visualização e previsão de crimes em sua capital, para controlar e prevenir os crimes mais comuns em espaços públicos, como roubos, furtos e invasão de residências e empresas. E, no Brasil, por meio do Programa Fortaleza, Cidade com Futuro, na cidade de mesmo nome, no norte do Brasil, promove-se a requalificação urbana com uma perspectiva de segurança, desenvolvendo um sistema integrado de gestão de segurança, baseado no monitoramento por vídeo, com uma análise criteriosa da governança necessária para seu bom funcionamento, juntamente com ações de prevenção primária da violência e do crime.
Por último, mas não menos importante, a abordagem de gênero deve ser transversal às políticas de segurança urbana. As experiências frente ao crime, à violência e ao medo da criminalidade diferem entre homens, mulheres e diversidades: enquanto os homens são vítimas majoritárias de homicídios por estranhos (geralmente ligados a situações criminais), a violência e o homicídio interpessoal, assédio e abuso respondem por razões de gênero. As mulheres temem os homens e evitam lugares onde possam encontrar estranhos “perigosos ou ameaçadores”; ou evitam lugares supostamente violentos, como certas ruas, becos ou túneis, plataformas de trem ou calçadas mal iluminadas, principalmente à noite.
O CAF apoia cidades da região para fortalecer suas capacidades em matéria de segurança. A segurança cidadã é uma condição necessária para o desenvolvimento humano e os governos locais ocupam, hoje, um lugar central em sua abordagem e gestão. A liderança de prefeitos e prefeitas é essencial para criar cidades mais seguras, que permitam aos seus habitantes exercer sua liberdade e direitos cívicos, não temam por sua integridade pessoal e desfrutem de seus bens.