Moradia acessível na América Latina e no Caribe
01 de agosto de 2023
A América Latina e o Caribe são uma região composta por uma diversidade de países, cada um com características geográficas, culturais, econômicas e sociais que os tornam únicos. No entanto, há um desafio comum que muitos deles enfrentam, também partilhado por outras regiões do mundo, que é o aumento do preço da habitação e a consequente dificuldade de muitas pessoas e famílias não conseguirem aceder a um habitat adequado.
Estima-se que na América Latina e no Caribe o déficit habitacional quantitativo afete mais de 23 milhões de pessoas e o déficit qualitativo (deficiências de materiais, quantidade de serviços básicos que chegam ao domicílio, etc.) afete mais de 46 milhões de pessoas. números que, somados, representam quase um terço dos residentes urbanos da América Latina e do Caribe. Este problema é especialmente pronunciado nas zonas urbanas, onde a procura de habitação excede frequentemente a oferta, aumentando os preços e dificultando a criação de opções de habitação mais acessíveis.
Uma característica importante a destacar destas lacunas no acesso à habitação é que elas se aprofundam se forem considerados aspectos ligados à etnia e ao género. Apenas para ilustrar este fato, pode-se notar que mais de 57% dos afrodescendentes e indígenas em ambientes urbanos vivem em bairros informais ou que apenas 25% dos proprietários de casas na região são mulheres. Em alguns países, observam-se também desigualdades muito acentuadas em termos de acesso aos serviços básicos. Por exemplo, na Colômbia, na Bolívia e no Uruguai, a população indígena ou afrodescendente sofre duas a três vezes mais com a falta de água do que o resto da população.
Colmatar estas lacunas requer intervenções políticas em múltiplas dimensões que envolvem aspectos ambientais, económicos e financeiros, regulamentares e de planeamento, e também perspectivas de género e inclusão. Entre as principais intervenções, são muito importantes aquelas que melhoram os rendimentos das pessoas, mas que também reduzem os custos de produção habitacional. Uma parte importante dos componentes desta estrutura de custos é excessivamente elevada na região. Por exemplo, em muitas cidades, o preço da terra, um componente-chave nos custos finais da construção de habitação, tende a duplicar a cada 6 a 10 anos, enquanto o rendimento médio de uma família latino-americana o faz aproximadamente a cada 80 anos. Os custos dos materiais de construção, como o aço ou o cimento, também são elevados em muitos países da América Latina e das Caraíbas, o que representa barreiras importantes para os promotores imobiliários ou para as próprias famílias construírem habitações de qualidade e a preços acessíveis.
Sem tentar ser exaustivo na abordagem, algumas recomendações podem ser apontadas para melhorar a acessibilidade da habitação na região.
- Estimular o crédito hipotecário: Em média, o crédito hipotecário é superficial na região (8% do PIB regional), bem abaixo da média europeia (37%) e dos Estados Unidos (70%). Este instrumento deve ser incentivado porque é impossível resolver a dimensão do défice apenas com recursos públicos. Num contexto de maior acesso ao crédito hipotecário, opções de financiamento mais acessíveis para famílias de baixos rendimentos, tais como hipotecas subsidiadas ou programas de microfinanciamento, podem ter maior alcance e eficácia.
- Melhorar o planejamento e design urbano: O planeamento e desenho urbano podem desempenhar um papel fundamental na criação de opções de habitação mais acessíveis, promovendo um desenvolvimento mais denso e compacto e um zoneamento de uso misto, controlando racionalmente a expansão da expansão urbana. Quanto mais terrenos edificáveis ou construtíveis puderem ser disponibilizados, maiores serão as chances de encontrar uma oferta que atenda à demanda.
- Estimular o ajustamento fundiário e a reforma fiscal imobiliária: Muitos países latino-americanos têm sistemas complexos de propriedade de terras, o que pode dificultar a mobilização de terras para habitação a preços acessíveis. Os governos podem implementar programas de reajustamento de terras para regularizar a posse e facilitar a construção de habitação a preços acessíveis. A reforma do imposto sobre a propriedade também pode ajudar a reduzir a carga fiscal sobre a propriedade sobre as famílias de baixos rendimentos.
- Promover melhores designs e a utilização de materiais e tecnologias de construção inovadores: A concepção e execução de infra-estruturas devem considerar os riscos e efeitos das alterações climáticas. O design resiliente e de baixo carbono é apresentado como uma oportunidade para aumentar a resiliência das infraestruturas e reduzir o seu impacto ambiental. Além disso, estratégias bioclimáticas e de sustentabilidade devem ser incorporadas desde a concepção dos projetos que permitam reduzir o uso de energia e o consumo de água. A utilização de materiais e tecnologias de construção inovadores, como habitações pré-fabricadas, pode reduzir o custo de construção, mantendo ao mesmo tempo os padrões de qualidade exigidos para uma habitação adequada.
A lista acima é apenas uma pequena amostra das opções políticas que devem ser consideradas para enfrentar os desafios complexos e multifacetados que o sector habitacional enfrenta na América Latina. É fundamental começar com um bom diagnóstico para identificar as melhores opções e a sequência de políticas, mas também é muito importante uma visão abrangente do problema que considere todas as dimensões indicadas e transcenda a visão estritamente sectorial da produção habitacional.
Estas e outras questões ligadas ao setor serão discutidas pelo CAF no V Fórum Latino-Americano e Caribenho de Habitação, que será realizado na cidade de Bogotá, de 31 de agosto a 2 de setembro. O Fórum constitui um dos espaços mais importantes da região para discutir questões habitacionais e estima-se que reúna, presencial e virtualmente, cerca de 900 participantes de diversos países da região e do mundo. Contará com a presença de ministros, prefeitos e altas autoridades da região, empresários, líderes sociais, acadêmicos, organismos multilaterais e agências internacionais, portanto, espera-se um ambiente muito propício para trocar ideias e pontos de vista e propor soluções para o enorme desafio. para colmatar as grandes lacunas habitacionais que a região enfrenta.
Pablo López
Especialista de desarrollo urbano, CAF - banco de desarrollo de América Latina y el Caribe -
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