Educação em uma pandemia: um ano perdido para a América Latina?

“Visiones del Desarrollo” é uma seção oferecida pelo CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- que analisa os principais temas de desenvolvimento da região. Os artigos que contém são publicados simultaneamente nos principais meios de comunicação latino-americanos.

24 de março de 2021

Após um ano de pandemia, praticamente todos os indicadores socioeconômicos da América Latina sofreram algum tipo de retrocesso. Pobreza, saúde, emprego, atividade econômica em geral... Educação.  

Acompanhar a nova dinâmica da educação a distância tem sido uma verdadeira dor de cabeça para pais, professores, escolas e sistemas educacionais que, em geral, não estavam preparados para uma ruptura tão acelerada e radical com a cultura tradicional de aprendizagem, baseada, principalmente, no ensino presencial.

Na verdade, de acordo com diversos especialistas, ao analisar o que aconteceu em 2020 em nível educacional, dificilmente podemos falar de avanços na aprendizagem, especialmente entre as crianças mais novas. Estima-se que no momento mais crítico dos confinamentos, mais de 160 milhões de alunos deixaram de frequentar as escolas.

A principal causa de a pandemia ter deixado os sistemas educacionais da região “fora do jogo” é exclusão digital. Ao contrário dos países do norte da Europa (líderes globais em qualidade educacional), a região não dispunha de ferramentas digitais integradas no dia a dia, nem de professores treinados para integrar plataformas virtuais aos processos de ensino. Em muitos casos, as próprias famílias não contavam com os dispositivos necessários para garantir a continuidade escolar de seus filhos.

Isso, somado ao fato de que, na América Latina, o fechamento de escolas demorou mais do que em outras regiões, mostrou que melhorias substanciais são necessárias para adaptar os sistemas educacionais às necessidades presentes e futuras.

“No curto prazo, os efeitos na aprendizagem serão devastadores e se preveem fortes aumentos na evasão escolar e no aprofundamento das lacunas socioeconômicas existentes; principalmente para quem vem de famílias com menos recursos”, afirma Bibiam Díaz, especialista em educação no CAF. “Não só haverá quedas significativas no desenvolvimento de habilidades básicas de leitura, escrita e matemática, mas, em geral, o desenvolvimento de meninos e meninas, que, por meio da escola, também têm acesso a serviços de saúde e alimentação”, complementa Díaz.

De acordo com a especialista, o maior risco para os jovens é a evasão escolar, já que alguns alunos não voltarão à escola quando voltarem as aulas presenciais. Esses jovens em risco de desligamento precoce dos estudos formais, seja para assumir tarefas de apoio em casa ou para ingressar no trabalho, verão sua trajetória educacional interrompida, terão menos oportunidades de acesso a empregos de qualidade e, previsivelmente, terão salários mais baixos e uma renda mais baixa e vida profissional menos produtiva.

A falta de contacto com a escola, a ansiedade e o estresse gerados pela crise favorecem esta problemática que, em uma situação pré-pandêmica, explicava a taxa média de evasão escolar de quatro em cada dez jovens do ensino secundário formal. Para reaprender a dinâmica educacional e evitar agravar problemas estruturais, Ruth Custode, especialista em Educação do UNICEF, explica que “ferramentas devem ser desenvolvidas para apoiar os alunos e identificar sintomas de estresse e angústia para garantir o aprendizado. Se uma criança não se sente bem, não aprenderá bem”. A especialista também sugere que devemos continuar com modalidades mistas, e que é necessário identificar as crianças vulneráveis ??para que, juntamente com suas famílias e professores, possam participar plenamente do sistema educacional.

 

Oportunidades

Uma das muitas lições deixadas pela pandemia é a necessidade de incorporar tecnologia aos sistemas educacionais, fechando lacunas no acesso à conectividade e dispositivos para alunos nas condições mais vulneráveis , bem como? treinamento de professores para tirar o máximo proveito dessas ferramentas. Na verdade, o uso da tecnologia deve estar presente tanto na educação remota quanto na presencial.

As oportunidades, portanto, são de ressignificar os processos de ensino e aprender que a relação entre alunos e professores não é determinada apenas pela espacialidade da sala de aula, mas pela geração de ambientes educacionais flexíveis e enriquecidos. Isso implica, entre outros, o uso de recursos virtuais e interativos, e requer esforços adicionais dos países para desenvolver as capacidades de professores e escolas.

Outra oportunidade é reformular a relação escola-comunidade, dando maior autonomia às escolas a partir da oferta das ferramentas necessárias para que os diretores possam exercer sua liderança pedagógica. Paralelamente, os governos latino-americanos deverão investir de forma mais eficiente na melhoria da qualidade dos sistemas educacionais. Neste contexto, devemos ter em mente que o último relatório PISA coloca os nove países latino-americanos avaliados abaixo da média dos países da OCDE.

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