A revolução digital está longe da América Latina
“Visiones del Desarrollo” é uma seção oferecida pelo CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- que analisa os principais temas de desenvolvimento da região. Seus artigos são publicados simultaneamente em El Comercio (Equador), El Comercio (Peru), El Nacional (Venezuela), El País (Uruguai), Portafolio (Colômbia), ABC Color (Paraguai), Página Siete (Bolívia), La Nación (Costa Rica).
Carros que dirigem sozinhos e também evitam acidentes de trânsito. Drones que entregam suas compras de mercado, roupas e tecnologia na porta de casa ou diretamente em sua janela. Telefones celulares que permitem controlar remotamente todos os eletrodomésticos de sua casa e até sugerem quando e como usá-los.
É provável que você tenha visto essas cenas em um filme ou que as tenha lido em uma matéria sobre os usos diários da chamada Internet das Coisas (IoT, em sua sigla em inglês), mas a realidade é que a revolução tecnológica ainda está longe de permear o cotidiano dos latino-americanos.
É verdade que a inovação e a ambição das BigTechs e das empresas líderes em tecnologia fazem da IoT uma realidade em setores consolidados dos países mais desenvolvidos e que seu impulso tornará essas tecnologias disponíveis em todos os países, em um curto espaço de tempo. Porém, também é verdade que a Internet das Coisas requer infraestruturas digitais avançadas, que possam ser implantadas em massa. Algo que, atualmente, é difícil de imaginar em regiões como a América Latina.
Por exemplo, para que os carros automáticos funcionem, é fundamental que as ruas e rodovias sejam dotadas de tecnologias que possibilitem uma direção autônoma, eficiente e segura. E para um drone entregar um hambúrguer na janela de sua casa, será necessário que tenha as infraestruturas físicas e digitais necessárias para o receber com segurança.
Essa realidade indica, por um lado, que os países com melhores infraestruturas digitais tirarão mais proveito da IoT, tanto para o desenvolvimento de indústrias relacionadas quanto para o desempenho econômico e seu retorno social. E, por outro lado, mostra que a implementação da IoT ameaça ampliar as lacunas já extensas que separam as economias avançadas das regiões em desenvolvimento.
Um diagnóstico inicial do estado das infraestruturas digitais na América Latina indica que houve um progresso significativo nas últimas três décadas, mas que o ecossistema digital continua mal preparado para enfrentar os desafios colocados pela IoT. Na verdade, um estudo recente indica que a América Latina investe em infraestruturas digitais quatro vezes menos que os países da OCDE e isso explica, em parte, o atraso em suas economias digitais. Portanto, boa parte desses investimentos deve ser focada na universalização da conexão de banda larga, cujo principal inimigo é a insuficiente interconexão entre os diferentes países e as infraestruturas atuais.
Estudos do CAF mostram que uma melhor infraestrutura de interconexão regional reduziria o custo do trânsito internacional em 38%, fato que implicaria uma redução de até 8,3% nas tarifas reais de banda larga. Por isso, a instituição está promovendo um Hub de Interconexão Digital no Panamá, que daria à região a oportunidade de melhorar a experiência do usuário final, melhorar a conectividade, reduzir custos e poder ter uma oferta regional que atenda às necessidades das Américas do Sul, Central e México. Além disso, está financiando a construção do primeiro cabo submarino entre a América Latina e a Ásia Pacífico, naquele que será o primeiro portal digital do Pacífico. Este projeto também recebeu o interesse da Argentina, Brasil e Equador.
A modernização institucional da economia digital também será crucial no processo de prevenção da explosão de lacunas. Entre as medidas que as instituições públicas podem adotar estão a promoção de políticas públicas que favoreçam conectividade, acessibilidade, segurança, confiança, direitos do usuário e livre concorrência na prestação de serviços digitais.
Outra das medidas necessárias baseia-se no desenvolvimento das indústrias digitais, promovendo ações para melhorar e facilitar o acesso a uma maior oferta de bens, serviços e produtos digitais.
A Internet das Coisas foi criada para revolucionar os setores tradicionais e provavelmente modificará substancialmente os padrões sociais e comerciais que conhecemos. A América Latina vive uma tendência que determinará seu futuro econômico no médio prazo e será decisiva para sua integração nas cadeias globais de valor.