Retomada: com tantas formas de intervenção, qual priorizar?
“Visiones del Desarrollo” é uma seção oferecida pelo CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- que analisa os principais temas de desenvolvimento da região. Seus artigos são publicados simultaneamente em El Comercio (Equador), El Comercio (Peru), El Nacional (Venezuela), El País (Uruguai), Portafolio (Colômbia), ABC Color (Paraguai) e La Nación (Costa Rica).
Na primeira página do manual de enfrentamento de crises econômicas e sociais para governos está a promoção da infraestrutura. Os postos de trabalho gerados em áreas diretamente afetadas e na cadeia de valor do setor, somados aos benefícios em conectividade, produtividade e bem-estar da população, são alguns dos motivos pelos quais investimentos em obras foram os protagonistas da retomada global após guerras e crises no século passado, bem como nos orçamentos dos países latino-americanos para 2021.
Um estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) divulgou dados sobre os empregos gerados pela infraestrutura na América Latina e no Caribe. “Em média, da amostra total de projetos de infraestrutura analisados, a cada USD 1 bilhão investidos na região, gera-se de 35 mil empregos diretos. Os resultados por subsetor indicam que, a cada USD 1 bilhão investido na região, em média, gera-se de 50 mil empregos diretos no setor de energia, 18 mil empregos diretos no setor hídrico e de saneamento e 12 mil empregos diretos no setor de transporte”, afirma o informe. Esses números podem ser duplicados ou triplicados quando incluídos os postos de trabalho indiretos gerados para fornecedores de materiais e, em geral, para os demais integrantes da cadeia de valor do setor.
Um relatório do Banco Mundial quanto ao potencial de geração de empregos diretos e indiretos no curto prazo estima que o investimento em projetos de infraestrutura gere em torno de 40 mil postos anuais de trabalho por cada USD 1 bilhão na América Latina e no Caribe, dependendo de variáveis, como a combinação de subsetores no programa de investimento, as tecnologias implementadas e os salários locais para mão de obra qualificada e não qualificada. Da mesma forma, existem alguns tipos de projetos, como os relacionados com a manutenção de estradas rurais, que podem empregar entre 200 mil e 500 mil trabalhados diretos anualizados por cada USD 1 bilhão investidos.
Demonstrada a eficácia da infraestrutura na geração de empregos no curto prazo, a questão que se coloca é: com tantas vias de intervenção, quais priorizar? O CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- trabalhou em uma metodologia para a priorização de projetos de infraestrutura do transporte terrestre com critérios de impactos, aplicada sobre uma base de mais de 2 mil projetos identificados, em 11 países da região.
A publicação Análise de investimentos no setor de transporte terrestre interurbano da América Latina até 2040 revela que o fechamento da lacuna na região exigirá esforços significativos, situando-se pelo menos em 2,6% do PIB, em que 0,7% deveria ser utilizado para ações de conservação e manutenção. Se expresso em recursos financeiros, com investimentos atuais da ordem de USD 34 bilhões anuais, a região deve alocar uma quantia três vezes superior, de cerca de USD 100 bilhões anuais, para convergir às médias mundiais em 2040.
“A relevância do investimento em rodovias se deve ao fato de que cada dólar investido em infraestrutura gera um aumento de 0,2 no PIB anual no longo prazo, o que representa um retorno econômico de 20%, e contribui três vezes mais para o crescimento que o investimento em outros modais (portos, aeroportos, ferrovias). No relatório, propomos uma lista de projetos de integração, de conexão física binacional, voltados para o desenvolvimento do comércio, como passagens de fronteira, pontes e melhorias institucionais, entre outros, que podem ser priorizados em 11 países da região”, afirmou Mónica López, especialista em Infraestruturas do CAF e coautora da publicação.
Na Argentina, por exemplo, foram identificados 274 projetos de mais de USD 7 bilhões que podem ser priorizados nas próximas duas décadas para ampliar o bem-estar da população e melhorar a competitividade e conectividade. Esta hierarquização foi dada por meio de seis critérios de avaliação de impacto rigorosos: expansão da cobertura e integração; reduzir custos para usuários; promover a integração logística e multimodal; minimizar custos de manutenção; promover a sustentabilidade ambiental e social; e valor do investimento.
“Entre as iniciativas definidas, encontram-se 54 projetos de pavimentação e conservação viária que são de rápida execução, com um impacto positivo no curto prazo, em matéria de emprego e crescimento. Também identificamos 24 projetos intermodais para aumentar a competitividade da Argentina”, acrescentou López.
Caminhos rurais
A pandemia e as obras de recuperação econômica e social também são uma boa oportunidade para priorizar os projetos que seguem a Agenda 2030 definida pela ONU, com a construção e a manutenção de obras básicas, resilientes e adaptadas às alterações climáticas, que garantam sua transitabilidade em todos os momentos, como forma de apoiar o desenvolvimento sustentável e o bem-estar da população, conforme proposto no relatório Estradas rurais: principais caminhos para a produção, conectividade e desenvolvimento territorial, elaborado por Gabriel Pérez, diretor de Assuntos Econômicos da Unidade de Serviços de Infraestrutura da CEPAL.
“Uma política efetiva de conectividade deveria buscar resolver a pobreza territorial, mais que a de lares individualmente. Para isso, gerar ações de fortalecimento institucional nos ministérios setoriais de obras públicas, transportes e demais setores é fundamental para incorporar nos desenhos estas novas dimensões, buscando a forma de atacar os problemas a partir de múltiplas frentes do Estado, de maneira coordenada, para aproveitar sinergias e ir sequencialmente reduzindo desigualdades y lacunas territoriais, para, assim, alcançar os objetivos da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável”.
Os limitados recursos dos governos para promover a recuperação dos países por meio de investimentos em estradas são uma oportunidade de criar empregos, melhorar a produtividade e a competitividade para impulsionar o comércio intrarregional e as cadeias produtivas locais, em face de um possível período de desglobalização, devido à pandemia. Essas são algumas das características que os governos nacionais e locais podem seguir em termos de priorização.