A arte de aproximar as aprendizagens de políticas públicas do setor público
Estudos rigorosos que possam fornecer informações úteis e relevantes para melhorar as capacidades institucionais dos órgãos públicos envolvem investimentos significativos em recursos e horas de trabalho. Por exemplo, a produção do Relatório de Economia e Desenvolvimento (RED) que o CAF -banco de desenvolvimento da América Latina- publica anualmente, leva dois anos entre a discussão dos possíveis temas de pesquisa e sua publicação. No entanto, fazer com que o conteúdo de aprendizagem de políticas atravesse as redes complexas da administração pública pode ser ainda mais desafiador.
Boa parte do conteúdo de qualidade e de evidência rigorosa tem um formato pouco amigável - seja por sua extensão, seja pelo tipo de linguagem usada - é pago e/ou publicado em um idioma diferente do espanhol. Inclusive, em uma pesquisa com 270 cientistas realizada pelo portal VOX em 2016,, entre os sete grandes problemas enfrentados pela ciência em sua tentativa de influir nas políticas públicas estavam os chamados paywalls ou muros de pagamento que limitavam o acesso ao conhecimento científico. E como são mal comunicadas as descobertas científicas!
Mesmo que essas barreiras sejam superadas, todo o conteúdo de conhecimento publicado na Internet deve competir com milhares de materiais de diferentes tipos - incluindo as fake news. Por exemplo, em cada minuto de 2019 foram publicados 511.200 Tweets, postadas 55.140 fotos no Instagram, quase 1.600 posts de blog no WordPress e mais de 500 horas de vídeo no Youtube. Além de que as horas do dia não são suficientes para poder acessar e conhecer todos esses conteúdos, os vieses cognitivos de nossos processos mentais limitam a quantidade de informações que podemos captar, armazenar e lembrar.
No auge da era da pós-verdade e do "Truth Decay", a linha entre os fatos e a opinião foi se apagando, diminuindo a confiança nas fontes de informações factuais que antes eram respeitadas. Um exemplo claro disso é a negação da mudança climática quandohá evidências importantes da influência da atividade humana sobre o clima e da necessidade de implementar uma abordagem preventiva.
Tudo isso, em vez de aproximar o conhecimento daqueles que mais precisam, provoca seu afastamento e o converte inclusive em um produto pouco atraente.
Levar evidências de políticas bem-sucedidas (e fracassadas) aos funcionários públicos da região é uma obrigação para os bancos de desenvolvimento, pois há estudos que mostram que podem influir em suas decisões. Por exemplo, um estudo experimental de Hjort, Moreira, Rao e Santini (2019) feito em 2.150 municípios do Brasil permitiu concluir que a entrega de informações sobre políticas simples, de baixo custo e eficazes a prefeitos aumentou em 10% a probabilidade de sua adoção.
Os canais de difusão tradicionais são um excelente ponto de partida. Por exemplo, na Scioteca, a biblioteca virtual do CAF, há centenas de materiais com conteúdo de qualidade em mais de 100 assuntos especializados, incluindo, por exemplo, água e saneamento, desenvolvimento rural, avaliação de impacto, integração, mobilidade urbana, segurança, transparência e negócios verdes. Ainda em dezembro de 2019, o CAF tinha traduzido para o espanhol e publicado 122 materiais de evidência rigorosa em diferentes formatos - incluindo resumos de mapas de evidência- gerados por nossos aliados em 3ie, BIT e The Campbell Collaboration.
Um próximo passo deveria ser considerar outras plataformas que sejam livremente acessíveis e de amplo alcance, e, claro, instaurar culturas de aprendizagem e gestão de conhecimento dentro das instituições públicas, para que aproveitem, além do conhecimento gerado por terceiros, os conhecimentos gerados no cotidiano. Isto é particularmente complicado no contexto latino-americano, onde os interesses políticos prevalecem sobre os técnicos. Essa realidade se reflete claramente nos resultados da Pesquisa de Inovação e Aprendizagem da Gestão Pública, promovida pelo CAF e pelo CLAD em 2018 e aplicada a 2.160 funcionários públicos da região: embora quase 70,3% dos funcionários pesquisados considerem que o conhecimento técnico e científico deve ser a principal influência na concepção e implementação de políticas, apenas 30% percebiam que era assim. Em contrapartida, embora menos de 10% dos entrevistados acreditem que os interesses políticos, eleitorais e partidários devem ser a principal influência na hora de desenhar e executar políticas, pouco mais de 37% percebiam que esse era o caso (isso sem contar pouco mais de 17% dos entrevistados que consideravam que o principal fator de influência era o mero critério pessoal dos tomadores de decisão).
Na área de desenvolvimento, os esforços de pesquisa não são muito úteis se seus resultados não forem colocados nas mãos e mentes daqueles que tomam decisões de políticas públicas. E os desafios que isso representa se multiplicam exponencialmente, dada a velocidade com que o conteúdo que é compartilhado no mundo cresce e a velocidade com que os cidadãos exigem respostas dos funcionários públicos. Esta é uma dinâmica em constante evolução e é por isso que precisamos rastrear e realimentar nossos processos de divulgação de conhecimento.