Dois anos de pandemia: o que mudou na América Latina?
Este artigo foi escrito por Anabella Abadi em colaboração com Lucila Berniell e Gustavo Fajardo.
Após quase dois anos de pandemia, os países vêm adaptando medidas de controle conforme a evolução da situação. Embora o esgotamento socioeconômico tenha levado as pessoas a saírem às ruas com maior regularidade, os governos optaram por substituir gradualmente as estratégias de confinamento (como a exigência de ficar em casa e o fechamento das escolas) pela promoção da vacinação e por medidas não farmacológicas de responsabilidade pessoal (como o distanciamento social, o uso de máscaras e a lavagem regular das mãos). Essa entrada lenta, mas sustentada, no “novo normal” foi mantida mesmo após a chegada da Ômicron no final de 2021.
A variante de preocupação (VOC, na sigla em inglês) Ômicron é mais contagiosa do que as anteriores. Este fato, somado à redução das medidas de confinamento, resultou em um maior número de pessoas infectadas. No entanto, nos países membros do CAF são relatadas notícias encorajadoras: a taxa de letalidade do vírus (entendida como a proporção de óbitos em relação ao total infectado) está nos níveis mais baixos de toda a pandemia (Gráfico 1).
As menores taxas de letalidade são decorrentes de vários fatores, incluindo os maiores níveis de imunidade (natural e por vacinação), a melhor compreensão do comportamento do vírus e seus modos de transmissão, e o maior conhecimento sobre como tratar pacientes com casos graves de COVID-19. Embora não seja trivial determinar qual é a principal causa por trás da queda da letalidade, os dados sugerem que o aumento da vacinação contribuiu substantivamente (Figura 2). De todo modo, ainda há um caminho a ser percorrido. O progresso da vacinação nos países latino-americanos tem sido desigual e, até o início de 2022, cerca de 200 milhões de pessoas não tinham completado o esquema vacinal contra a COVID-19 (duas doses para a maioria das vacinas). Além disso, apenas uma pessoa em cada três completamente vacinadas recebeu uma dose de reforço. Embora a variante Ômicron seja menos letal, os casos graves de COVID-19 continuam a representar um risco significativo para a população com mais de 75 anos e para os não vacinados. Ademais, estudos preliminares com dados de Israel parecem indicar que a vacinação, além de reduzir o risco de casos graves de COVID-19, também reduz o risco de COVID persistente. Entre as pessoas que tiveram COVID-19 há pelo menos um ano, as totalmente vacinadas apresentaram menor probabilidade de apresentar dores de cabeça (54% menos), fadiga (64% menos) e dor muscular (68% menos) do que as não vacinadas. Por sua parte, o fortalecimento dos sistemas de saúde e de monitoramento epidemiológico deve se tornar uma prioridade. Por um lado, a detecção e a ação antecipadas em relação a novos surtos ou novas variantes de COVID-19 serão uma tarefa essencial daqui para frente. Toda essa experiência recente explicitou o quanto as doenças contagiosas podem ser prejudiciais e trouxe à tona, portanto, a importância de investir em sistemas de prevenção e detecção. Por outro lado, o fortalecimento dos sistemas de saúde é uma dívida pendente da região, que piorou nos últimos dois anos. Nesse sentido, o grande desafio continua sendo o de garantir a cobertura universal de saúde, em especial reduzindo as lacunas existentes entre os sistemas de saúde fragmentados que coexistem na região e que marcam desigualdades significativas de acesso e qualidade.